quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

A tiete que reflete

Muitos sabem que sou verdadeira amante do futebol. Vou ao estádio, torço ferozmente pelo meu time do coração, acompanho a maioria dos campeonatos e, como toda boa brasileira, tenho um interesse especial pela seleção brasileira. E para minha felicidade, a seleção jogaria na minha cidade na última semana.

Assim que soube da presença da (discutível) elite do futebol brasileiro armei todo um esquema para acompanhá-la: ir ao estádio, assistir aos treinos, tudo – conforme manda o figurino. Porém minhas tentativas neste aspecto foram em vão.

No dia da venda dos ingressos para o jogo, rumei para a bilheteria com certa antecedência para conseguir as entradas, só que para minha surpresa e raiva, tudo acabou em poucas horas e algumas pessoas na minha frente.

Só conseguiria entrar no estádio comprando o ingresso de algum cambista que praticasse juros exorbitantes, bem acima do meu cheque especial ou cartão de crédito. Confesso que minha vontade era de trombar com tal “contraventor”, enchê-lo de pancada e pegar todos os ingressos dele – Perdeu, playboy! Você é um fanfarrão! Pede pra sair!

Conformada com a minha não ida ao jogo, restava me contentar com o treino que seria aberto ao público no estádio. Pensando que seria como o jogo ocorrido em outra cidade: comprei um quilo de alimento não perecível e rumei para o dito local.

Uma verdadeira muvuca estava armada na frente do estádio: carros de emissoras de tv, polícia e vários torcedores, como eu, munidos de seu feijão, açúcar e arroz. Porém demos com a cara no portão!

Diante daquela confusão, não sabia o que fazer, então circundei o estádio e vi um dos acessos aberto – era por onde a rede de lanchonetes que atende o local entregava seus quitutes no momento do início do treino. Não pensei duas vezes, adentrei ao recinto, me acomodei na arquibancada e por ali fiquei por menos de quinze minutos.

Por uma exigência ridícula de alguém que não sei quem aquele treino de reconhecimento do campo não poderia ser visto pela massa de não-jornalistas que me seguiram e entraram no estádio, e por isso a polícia enxotou os torcedores da arquibancada, inclusive eu.

- Deixe o recinto, moça!
- Mas por quê? Eu quero ver o treino!
- O treino não é aberto. É proibido ficar aqui hoje! Como você entrou?
- Ué, pelo portão! Onde mais? Ou você acha que sou mulher de ficar pulando portão, seu policial? – E fui embora dali a passos fortes.

Porém nem tudo foi perdido na minha investida de torcedora fanática. Em todas estas investidas tive a companhia de um amigo meu, que ficou algumas horas na fila de ingressos e invadiu o estádio para assistir ao treino comigo - ele também é amante de futebol, se não fosse, não teria acatado minha brilhante e maluca idéia de ver a seleção no hotel - e foi isso que salvou o dia!

Combinamos ir ao hotel ver a seleção antes de partir para o treino de reconhecimento do campo; só dessa forma veríamos os jogadores de algum jeito.

Chegando ao hotel deparei com aquele circo de jornalistas esportivos, complementado por uma dupla de comediantes, uma ex-modelo repórter de programa de fofocas e várias adolescentes alucinadas, insanas e com gogós bem potentes. Pensei: Putz, e agora? - Depois de tantas tentativas frustradas, a única coisa que eu queria era ver a única celebridade merecedora da minha admiração.

Não é ator, autor, cantor, um artista qualquer, mas sim um artista da bola. Embora meio esquecido pela imprensa e no banco de reservas da seleção desde a Copa América; nutro por ele uma admiração incondicional. Não chega a ser uma tietagem, pois não sou do tipo de pessoa que grita por qualquer um, mas um desejo de querer conhecer a pessoa, conversar, saber como ela é fora do ambiente que envolve as quatro linhas do campo.

Depois da entrada naquele espetáculo montado a céu aberto na frente do hotel, passei a reparar no que estava ao redor: o ônibus da seleção à direita e um mini-campo de golfe à esquerda, que pouco chamou minha atenção. Porém o amigo que me acompanhava reparou numa coisa que não havia reparado naquele campinho: quem jogava, e me chamou:

- Dá só uma olhada!, e apontou
- Tá zuando! – Sim! Era ele!

Na hora não sei que turbilhão de emoções tomou conta do meu corpo. Não sabia o que fazer a não ser olhar meu admirado e pensar: Por favor, seja um cara estúpido bem escroto, para eu parar com essa admiração, contrárias às minhas concepções que negam qualquer forma de tietagem. Acho isso tão ridículo!

Mas para saber se o cara era um estúpido escroto tinha que me aproximar dele. Cheguei a um câmera que filmava o meio-campista reserva e o goleiro titular jogando golfe, e perguntei:

- Será que eles se incomodam de eu pedir para tirar uma foto com eles?
- O máximo que você pode ouvir é um não.

Na hora meu amigo interfere:

- Vai lá! Tenho certeza que você nunca receberá um não.

Entreguei minha alma a Deus, a máquina fotográfica para meu amigo, respirei fundo e caminhei em direção ao jogador. Quando estava na metade do trajeto, o jogador olha na minha direção; vendo que aquela era a minha deixa, disparei:

- Por favor, você pode tirar uma foto comigo?

Ele abre um largo e lindo sorriso e diz: Claro! - Poxa! Não estava nos meus planos ele ser simpático e receptivo. Mal sabia eu que tudo que arquitetara desabaria em poucos segundos.

Ao nos aproximarmos me apresentei e o cumprimentei como é de praxe em terras paulistanas: um encosto de rostos; só que ele me ofereceu a outra face e eu estalei um beijo na sua bochecha esquerda, sentindo que sua barba nem espeta e marcando sua face com meu batom. Por instinto natural, sublimo a mancha colorida feita pela minha boca com os dedos e reparo no quanto este gesto é carregado de carinho e afetividade.

É hora da foto, faço um malabarismo corporal para ficar mais baixa que ele e ele circunda minha cintura com seu braço. Faço o mesmo: encosto minha mão em suas costas, mas reparo que minha mão não obedecia e tremia de forma incontrolável. Atentando para isso afasto-a para que ele não perceba minha falta de controle corporal.


Nos despedimos e me afasto. É neste momento que percebo que em situações de emoção extrema não tenho algum controle do meu corpo: começo a pular, a dançar, a sorrir e sinto meu coração disparar. Reação equiparada naqueles primeiros beijos de paixão adolescente.

O goleiro titular pede para que eu saia da direção da bola de golfe a ser lançada, pois a mesma poderia me machucar. Pensei: pode jogar o que você quiser não tô sentindo meu corpo mesmo... E saí do mini-campo.

De longe, observo aquele jogador que tanto me fascina, e reflito: “ele tem tudo que eu gosto num homem e é tudo que eu não quero pra mim: ele é mais baixo que eu, mais novo que eu, mas em compensação, tem um sorriso lindo, os olhinhos pequenos, covinha no rosto, uma pele gostosa, um corpo bem torneado, um carisma absurdo, além de aparentar ter aquela pegada!”

Confesso que a idéia de dar meu telefone pra ele passou pela minha cabeça, mas já era tarde – também, de tanto refletir... – ele tinha rumado para dentro do hotel e seguiria para seu treino de reconhecimento.

Até tentei uma outra aproximação na ida ou na volta do famigerado treino, mas não consegui entregar o papelzinho com meus números rabiscados. Isso ficará para uma outra oportunidade. Porém tenho consciência de que este novo encontro não será a mesma coisa, afinal de contas, os momentos sublimes e verdadeiramente inesquecíveis só acontecem uma vez!

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